(Carlos Drummond de Andrade)
E como eu palmilhasse vagamente
uma estrada de Minas, pedregosa, e no fecho da tarde um sino rouco
se misturasse ao som de meus sapatos
que era pausado e seco; e aves pairassem no céu de chumbo, e suas formas pretas
lentamente se fossem diluindo
na escuridão maior, vinda dos montes e de meu próprio ser desenganado,
a máquina do mundo se entreabriu
para quem de a romper já se esquivava e só de o ter pensado se carpia.
Abriu-se majestosa e circunspecta,
sem emitir um som que fosse impuro nem um clarão maior que o tolerável
toda uma realidade que transcende
a própria imagem sua debuxada no rosto do mistério, nos abismos.
Abriu-se em calma pura, e convidando
quantos sentidos e intuições restavam a quem de os ter usado os já perdera
e nem desejaria recobrá-los,
se em vão e para sempre repetimos os mesmos sem roteiro tristes périplos,
convidando-os a todos, em coorte,
a se aplicarem sobre o pasto inédito da natureza mítica das coisas.
(Trecho de A Máquina do Mundo, de Carlos Drummond de Andrade).
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Poema Sujo
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Soneto da Fidelidade
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Via Láctea
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O Cão Sem Plumas
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As Cismas do Destino
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As Pombas(Raimundo Correia)
Vai-se a primeira pomba despertada…
Vai-se outra mais… mais outra… enfim dezenas De pombas vão-se dos pombais, apenas Raia sanguínea e fresca a madrugada.
E à tarde, quando a rígida nortada
Sopra, aos pombais de novo elas, serenas, Ruflando as asas, sacudindo as penas, Voltam todas em bando e em revoada.
Também dos corações onde abotoam,
Os sonhos, um por um, céleres voam, Como voam as pombas dos pombais;
No azul da adolescência as asas soltam,
Fogem… Mas aos pombais as pombas voltam, E eles aos corações não voltam mais. |
Invenção de Orfeu
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